domingo, 5 de julho de 2009

Dantas, o minerador


Às vésperas da Operação Satiagraha, em 8 de julho de 2008, o delegado Protógenes Queiroz tinha em mãos um documento revelador sobre os planos empresariais do banqueiro Daniel Dantas. Escrito em inglês e preparado, em 1992, pelo ex-ministro de Assuntos Estratégicos Mangabeira Unger, que deixou o cargo no fim de junho, o texto era um umbrella deal (acordo guarda-chuva) com perspectivas de negócios no Brasil que atendessem, segundo Queiroz, aos interesses comerciais de Dantas e do Citigroup, um dos maiores bancos do planeta e até então parceiro inseparável do banqueiro brasileiro. Entre os 160 itens do documento, um deles traçava estratégias de entrada no bilionário mercado de mineração. DD levou o assunto a sério. De 2007 até hoje, encaminhou mais de 1,4 mil pedidos de autorização de pesquisa mineral, em treze estados do País. Já conseguiu obter mais da metade das autorizações, 80% delas em terras da União.

As outorgas para esse tipo de atividade são concedidas pelo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) do Ministério de Minas e Energia. Para atuar no ramo, Dantas montou, há dois anos, uma empresa, a Global Miner Exploration (GME4), com sede em São Paulo, e começou a garantir as concessões a partir das gestões de dois ministros diretamente controlados pelo senador José Sarney (PMDB-AP), Silas Rondeau e Edison Lobão. Graças à presteza do DNPM, a mineradora de Dantas cobre, hoje, uma área equivalente a 4 milhões de hectares onde se concentram riquezas minerais incalculáveis em forma de manganês, ouro, alumínio, fosfato, ferro, níquel, bauxita, nióbio e diamante.

sexta-feira, 3 de julho de 2009

Sobre Madoff, inveja e soluções

JORGE HAGE


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Aqui só se permite levar o réu à prisão após o trânsito em julgado do último recurso, geralmente no STF. Sabe o que isso quer dizer?--------------------------------------------------------------------------------



A RÁPIDA e pesada condenação do financista vigarista Bernard Madoff a 150 anos de prisão e seu imediato recolhimento à cadeia (onde, aliás, já estava, mesmo antes da sentença) mereceu de Clóvis Rossi primorosa coluna nesta Folha, sob o sugestivo título "Madoff e a inveja". A mesma Folha de 30/6 trazia excelentes reportagens de Fernando Canzian e Frederico Vasconcelos sobre o fato, todas elas destacando as abissais diferenças entre as condições para a punição de crimes financeiros e outros "de gente rica" nos Estados Unidos e no Brasil. De fato, é de dar inveja. Mas cabe ir além para indagar: por que "nós não podemos" (para usar frase da moda)?
Sim, nós podemos. Basta querermos mudar nossa legislação penal e processual e, com ela, mudar a interpretação que vem sendo dada a certos princípios constitucionais, sobretudo os famosos princípios da "ampla defesa" e da "presunção de inocência". Tenho dito e repito aqui: qualquer país civilizado tem nesses princípios cláusulas fundamentais de garantia do cidadão. Nenhum, porém, extrai deles o que se faz no Brasil.
Aqui só se permite levar o réu à prisão após o trânsito em julgado do último recurso, geralmente no Supremo Tribunal Federal. Sabe o leitor leigo o que isso quer dizer? Em suma, quer dizer que se tem de esperar a interposição e o julgamento, pelo menos, dos seguintes recursos: um ou vários recursos em sentido estrito e um ou vários embargos declaratórios no primeiro grau; uma apelação após a sentença; um ou vários embargos declaratórios e um embargo infringente no tribunal de segundo grau; se houver alguma decisão do relator, mais alguns declaratórios e um agravo regimental; depois, vêm o recurso especial (para o Superior Tribunal de Justiça) e o extraordinário (para o STF); se inadmitidos estes pelo Tribunal de Justiça (ou Tribunal Regional Federal), vem o agravo de instrumento para forçar a admissão, o qual será examinado pelo relator, de cuja decisão podem caber novos agravos regimentais e embargos declaratórios (que, aliás, cabem de cada uma das decisões antes mencionadas, e repetidas vezes da mesma, bastando que se diga que restou alguma dúvida ou omissão).
Cansados? Pois nem falamos ainda nas dezenas de outros incidentes processuais que os bons advogados sabem suscitar, dentro ou fora das previsões legais expressas, além dos habeas corpus e mandados de segurança, em quaisquer das instâncias. E quem melhor que os réus dessa casta pode pagar os melhores escritórios de advocacia?
Então, se pela "presunção de inocência" se quer entender que o réu só pode ser preso após o último recurso e se até as pedras sabem que isso vai demorar pelo menos uns 15 ou 20 anos, nada mais resta a fazer senão lamentar.
Pouco adianta fiscalizar (tarefa da Controladoria Geral da União, dentre outros órgãos), investigar (tarefa da Polícia Federal e do Ministério Público), ajuizar ações (tarefa do Ministério Público) ou mesmo dar celeridade ao processo no primeiro grau e sentenciar, pois isso, no Brasil, não vale quase nada.
Fui juiz de primeiro grau e sei o tamanho da angústia. O criminoso, no Brasil, mesmo se condenado no primeiro grau e ainda que a sentença seja confirmada pelo TJ ou pelo TRF, continua gozando da "presunção de inocência". Atente-se bem: no confronto entre dois pronunciamentos convergentes e unânimes de duas instâncias judiciais, de um lado, e as alegações do réu, de outro, prevalece, como "presunção de veracidade", a versão do réu.
Voltemos aos EUA e ao caso Madoff: ele foi condenado, diz a Folha, "por uma corte de Nova York" (não foi a Suprema Corte nem nada parecido) e, "logo após a sentença, encaminhado a uma unidade prisional em Manhattan". A investigação começou em 2008 -isto é, há cerca de apenas um ano...
Será que podemos acusar os EUA de não serem um "Estado de Direito"? Será que Madoff não teve direito ao "contraditório" e à "ampla defesa"? Será que lá não vigora a "presunção de inocência"? Será que eles são um "Estado policialesco"? E mais: a pena aplicada lá certamente será cumprida, pois não há a escandalosa liberdade condicional com um sexto da pena cumprida.
Sem deixar de reconhecer o valor dos princípios da ampla defesa e da presunção de inocência, formulados quando nosso país saía de uma ditadura e o perigoso inimigo era o Estado autoritário, creio já chegada a hora de ajustarmos o passo do nosso processo judicial àquilo que é o ponto de equilíbrio assente nos demais países civilizados para enfrentar inimigos outros, como o crime organizado, o crime financeiro e a corrupção.

JORGE HAGE, 71, mestre em direito público pela UnB (Universidade de Brasília) e em administração pública pela Universidade da Califórnia (EUA), é ministro-chefe da Controladoria Geral da União.

quinta-feira, 11 de junho de 2009

OPERAÇÃO SATIAGRAHA

Juiz impede que De Sanctis tenha acesso a dados sigilosos

DA REPORTAGEM LOCAL

O juiz federal Ali Mazloum, responsável pelo processo aberto para averiguar vazamento de informações na Operação Satiagraha, recusou, na última segunda-feira, os pedidos do juiz federal Fausto De Sanctis e do procurador da República Rodrigo de Grandis para terem acesso aos dados sigilosos que integram o processo.
Em decisão tomada em maio, Mazloum escreveu que o juiz e o procurador trocaram telefonemas, entre fevereiro e agosto de 2008, com o delegado da Polícia Federal Protógenes Queiroz, coordenador da Satiagraha.
No entender de Mazloum, as supostas ligações seriam motivo para abertura de procedimentos no CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e no CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público).
Em entrevista à imprensa, em maio, De Grandis disse que contatos, se ocorreram, nada significam de irregular, pois o delegado era o responsável pelo cumprimento de várias decisões judiciais tomadas antes, durante e depois da operação. De Sanctis preferiu não comentar.
Mazloum também recusou o pedido feito pelo empresário Luís Roberto Demarco para ter acesso aos dados sob sigilo. Em maio, Mazloum escreveu que Protógenes trocou telefonemas com a empresa de Demarco, a Nexxy Capital. O empresário e o delegado negaram tais telefonemas. (RUBENS VALENTE)

domingo, 10 de maio de 2009

Cheney acusa Colin Powell de não ser republicano

Washington, 10 mai (EFE).- O ex-vice-presidente americano Dick Cheney atacou hoje o ex-secretário de Estado Colin Powell, com quem trabalhou no primeiro mandato de George W.
Bush, e o acusou de "ter abandonado o Partido Republicano".

Powell, o primeiro afro-americano a chefiar a diplomacia americana, apoiou o candidato democrata Barack Obama nas eleições passadas, o que lhe rendeu muitas críticas de seu partido.

As criticas cresceram há poucos dias, quando Powell sugeriu que o Partido Republicano, imerso em uma crise, deveria se movimentar mais ao centro e adotar ideais mais moderadas.

Hoje, em entrevista à cadeia de TV "CBS", Cheney foi perguntado pela polêmica, e disse: "Acho que Colin já deixou o partido, não acredito que siga sendo republicano".

Para ele, a decisão de Powell de apoiar a Obama "é bastante indicativa de para onde vão suas lealdades e seus interesses"

sexta-feira, 8 de maio de 2009

A PEC dos precatórios

Cerne do texto debatido no Congresso, reserva obrigatória de verba para a quitação de dívida judicial deve ser mantida

O GOVERNO desapropria um terreno a fim de realizar uma obra; o proprietário não se satisfaz com o valor oferecido, aciona a Justiça e tem reconhecido, em decisão da qual já não cabe recurso, o direito de receber do erário a quantia demandada.
Eis exemplo clássico de precatório, termo que designa esse gênero de obrigações financeiras da administração pública para com cidadãos ou empresas -outro tipo muito comum de precatório são direitos salariais de servidores ou aposentados reconhecidos pelo Judiciário.
O assunto é objeto de um impasse de duas décadas, que a democracia brasileira lamentavelmente ainda não conseguiu resolver. Apesar de os precatórios constituírem obrigações inapeláveis, governos municipais e estaduais, alegando insuficiência de fundos, não os liquidam em tempo hábil. Por conta disso, uma montanha de dívida judicial foi se acumulando com os anos.
Se decidisse quitar todos seus precatórios em um ano, o Estado do Rio, por exemplo, teria de destinar para esse fim R$ 28 de cada R$ 100 que entrassem em seus cofres. São Paulo, Estado onde o estoque dessas dívidas judiciais equivale a 23% da receita anual, não fica muito atrás.
A Constituição de 1988 deu oito anos para os governos estaduais e municipais liquidarem seus precatórios. Como a situação não melhorou, em 2000 uma emenda à Carta concedeu mais uma década de prazo. Mas o problema continua, como atesta o fato de o pagamento dos precatórios estaduais paulistas ditos alimentares -referentes a salários, aposentadorias, pensões etc.- não ter avançado além das dívidas contraídas até 1998.
Agora uma nova proposta de emenda constitucional sobre o tema tramita no Congresso. Pela primeira vez prevê-se um mecanismo para obrigar os governos a reservarem, todo ano, uma fatia de seu orçamento destinada exclusivamente ao pagamento de precatórios. Outra inovação bem-vinda é a norma que dá preferência a idosos no recebimento dessas obrigações -a espera é tanta que milhares de brasileiros morrem antes de receber a quantia a que faziam jus.
A Ordem dos Advogados do Brasil, no entanto, lidera reação veemente à proposta, que já foi aprovada no Senado e começa a ser analisada na Câmara. Uma das principais críticas recai sobre a mudança na fila do pagamento, a qual hoje respeita a ordem cronológica das decisões judiciais que geraram cada precatório e passaria a obedecer a um critério de valor: seriam quitadas na frente as dívidas menores e por último as maiores.
Outro ponto de atrito é a previsão de leilões de dívida, presente no projeto. Os detentores de precatórios que quisessem receber na frente dos outros ofereceriam um desconto ao governo; os que propusessem os maiores abatimentos seriam contemplados.
Esses dois aspectos, que são de óbvio interesse dos governos estaduais e municipais, podem ser negociados e modificados no Congresso sem que se perca o cerne da proposta -e a oportunidade de dissolver, de vez, o impasse dos precatórios